Minhas Linhas do Horizonte
Trata-se de um diálogo íntimo com a pintura, a velha senhora pintura. E, nesse meu caso com a da pintura, a linha do horizonte assinala a retomada de um gênero clássico: a paisagem. Mas não exatamente no sentido tradicional da representação da paisagem naturalista, mas sim, segundo Alberto Tassinari sobre a pintura de Anselm Kiefer, “um espaço em obra que também deixa entrever uma paisagem. É mais uma nostalgia da paisagem naturalista com seus horizontes outrora longínquos que a potência da pintura retoma”. A linha do horizonte demarca, portanto, minhas paisagens subjetivas, paisagens do afeto, uma paisagem interior. Uma linha do horizonte há muito perdida no caos urbano em que vivemos (sim, porque, sob os escombros da pós-modernidade a natureza se foi embora para sempre…) que demarca minhas paisagens da solidão. Daí uma certa predileção pela linha do mar, pela perspectiva de uma estrada que se perde no infinito, pela extensa linha das margens dos rios amazônicos, nossas paisagens da imensidão. Há, como sempre em meu trabalho, um desejo de exílio, de evasão, uma vontade de fuga da banalidade, das atrocidades que nos assolam cotidianamente em nossa urbe degradada a violentar nossos sentidos… (Calma aí, coração! Nada de discurso sociológico, ahah…). Voltemos à pintura: é mais um estado de retiro, de deleite estético do pintor-professor em seu “refugium pictorum”. A vontade, a necessidade de restaurar o prazer da pintura. Então, o atelier vira uma cozinha de cores. Eu pingo meu colírio alucinógeno (aquele do Zé Simão), e aí, as mais variadas técnicas entram em campo para a experiência de uma alquimia cromática. Tintas acrílica e óleo, aquarela, pastel seco e a óleo, lápis de cor, caneta hidrocor,… tudo junto e misturado para celebrar as cores em todas as suas variações e vibrações possíveis. O uso da cor absolutamente sem pudor. Porque o nosso mundinho anda muito chato com uns ralos cinquenta tons de cinza… Tenho necessidade da cor, tenho saudade da pintura, Turner, Monet, Van Gogh, ahhh… E essa nostalgia da paisagem acaba, vejam só, me levando a um diálogo com a fotografia. Especialmente a fotografia paraense, da qual eu revisito imagens que considero icônicas, como a “Babá Patchouli”, do Luiz Braga, e “Primavera”, do Miguel Chikaoka, que fazem parte de minhas paisagens afetivas. Outras inspirações (sim, inspiração, hoje quase um pecado na contemporaneidade, ahah…), vêm da literatura (“Os últimos horizontes da Terra, segundo Roberto Bolanõ”, por exemplo), da música, do cinema, do meu caleidoscópio de referências… Mas tudo isso é apenas pretexto para a saudável experiência do prazer de pintar, o ato visceral, sexual, vital da pintura.
Jorge Eiró
Setembro 2014.
PS.: A propósito, “não tenho paredes, só horizontes”, bem poderia ser a epígrafe…