O Brasão Original no “Estatuto Original” da U(F)PA

Em consulta ao PARA A HISTÓRIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (PANORAMA DO PRIMEIRO DECÊNIO), contido em OBRAS REUNIDAS DE EIDORFE MOREIRA VOL.V — uma publicação do Conselho Estadual de Cultura do Pará e Secretaria de Estado de Educação (Editora CEJUP) —, encontramos, em O Estatuto Original da Universidade do Pará.,  aprovado pelo DECRETO Nº42.427 de 12 de outubro de 1957, o seguinte artigo:

O Estatuto Original*, aprovado três meses após a criação da Universidade do Pará, fora reformado em 1963 (D.O.U. de 09-09-1963), mantendo o mesmo Artigo 26 em seu texto.

Eidorfe escreve sobre os primórdios da UFPA, dando sentido às fotografias da cerimônia no Teatro da Paz:
“…Com exceção da instalação, quase todos os atos constitutivos mais importantes da Universidade realizaram-se no mesmo ano da lei que a criou, sem fugir ao ritmo dos casos análogos. Assim é que, três meses depois de criada a Universidade, entrou em vigor o seu Estatuto, aprovado pelo Decreto 42.427, de 12 de outubro de 1957, um mês antes do prazo estabelecido pela lei instituidora, que em seu art. 10 estabelecia para isso o prazo de 120 dias. E logo no mês seguinte, a 19 de novembro, era nomeado o primeiro Reitor, Dr. Mário Braga Henriques, Professor de Direito Comercial, que tomou posse a 28 do mesmo mês e ano.
Apenas o ato de instalação não acompanhou o ritmo normal dos demais atos constitutivos, pois ocorreu mais de um ano e meio depois, achando-se porém a Universidade funcionando regularmente desde o ano da sua criação.
A instalação realizou-se a 31 de janeiro de 1959, no Teatro da Paz, em sessão solene com a presença do Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira, que então comemorava seu terceiro ano de governo. E foi precisamente a conveniência de associá-la à programação comemorativa desse evento que explica o retardamento de tal solenidade.
Sem fazer alusão ao retardamento, o próprio Ministro da Educação e Cultura ressaltou na ocasião a significação da concomitância dos dois atos: ‘Competa hoje V Excia., Sr. Presidente, o terceiro ano de seu fecundo, operoso e patriótico governo. Para comemorar tão grato acontecimento, nada mais expressivo do que esta solene instalação da Universidade do Pará. Assim pensando, reservou V. Excia. esta data para vir, pessoalmente, presidir a este ato de rara transcendência, honrando-o e exaltando-o com a sua prestigiosa presença’.
Falaram na ocasião o Reitor, Prof. Mário Braga Henriques, fazendo ligeiro histórico da instituição; o Ministro da Educação e Cultura, Dr. Clóvis Salgado da Gama, proferindo o discurso de instalação; o Reitor da Universidade do Ceará, Prof. Antonio Martins Filho, em nome das demais Universidades, e o Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira, falando sobre o seu governo.
Mas o que sobretudo importa salientar no caso é que a instalação da Universidade não constituiu um ato simbólico isolado e meramente formal, mas sim parte integrante do próprio contexto simbológico da integração nacional, do qual fez parte também a conclusão simbológica do desmatamento da estrada Belém-Brasília, conclusão simbolizada com a derrubada da última árvore, ato igualmente solenizado com a presença do Presidente. Encarada sob esta ótica, a instalação da Universidade representou o lado ou sentido cultural desse simbolismo.
Duas realizações de alto significado nacional coroavam-se, assim, de uma aura simbólica, de modo que, em termos de simbolismo, pode-se dizer que nenhuma Universidade brasileira terá sido mais expressiva neste particular do que a do Pará, tanto mais quanto, considerada no tempo, ela teve as mesmas coordenadas históricas da nova capital do País, como veremos noutro capítulo…”

O Ministro da Educaçãoe e Cultura, Dr. Clóvis Salgado da Gama, proferindo o discurso de instalação da Universidade do Pará.

“Não se pode dizer que, ao surgir no plano histórico, a Universidade paraense já tenha nascido ‘atualizada’, nem tal poderia acontecer, por se achar filiada a uma rede universitária mais ou menos uniformizada em todo o País. Mas se essa filiação não a favorece então nesse sentido, nem por isso ela deixava de ser uma Universidade progressista, como nos dá prova o próprio ritmo inicial de seu crescimento.
Por outro lado, uma Universidade não tem somente compromissos com o tempo, senão que também com a região subdesenvolvida, como no caso da Amazônia. Com exceção talvez do Nordeste, em nenhuma outra parte do Brasil seria exigível de uma Universidade compromissos mais sérios neste sentido do que no Extremo Norte.
Eis por que, pelo simples fato de se achar localizada numa região subdesenvolvida, a novel Universidade teria que orientar a sua política de ensino e de pesquisa num sentido regionalista, o que de fato ficou expresso desde logo no seu Estatuto original, em dispositivo já transcrito no capítulo anterior (art. 1°, letra b), e reforçado posteriormente com a Lei nº 4.283, de 18 de novembro de 1963, que assim se manifesta a respeito:
‘Art. 14 — A Universidade do Pará poderá criar centros de estudo e de pesquisa para a formação de técnicos que possibilitem o levantamento das riquezas minerais, da flora e da fauna da região, bem como a introdução de técnicas de cultura, visando ao aproveitamento das possibilidades econômicas da Amazônia e o equacionamento de seus problemas sociais’.” (Eidorfe Moreira)

Esse “sentido regionalista” fora representado por Maÿr Sampaio Fortuna no Brasão Original que ornamentou o cenário do palco do Teatro da Paz, nas flâmulas dispostas à mesa solene e no “distintivo” sobre as “vestes talares” do primeiro Reitor, Mário Braga Henriques, na cerimônia de instalação da Universidade do Pará:

Foto do “distintivo” reitorial original: Patrick Pardini.

Professor Antonio Martins Filho, Reitor da Universidade do Ceará.

O Presidente da República, Juscelino Kubitschek de Oliveira, ladeado pelo Governador do Pará, Magalhães Barata, e pelo Reitor, Mário Braga Henriques.

Maÿr Sampaio Fortuna, autor do Brasão Original da UFPA, nos parece um seguidor do ideário do artista plástico paraense Theodoro Braga:
“…Assim, por que escolher, águias e leões, ursos e elefantes para ornamentação dos nossos edifícios, exterior e interiormente, desde as fachadas dos monumentos aos mais delicados objetos de salão, quando a nossa fauna inesgotável nos fornece a Harpia destrutor, condor guainense, imponente de força e de altivez, eriçando a sua crista parda, com uma régia coroa? A onça, rajada ou negra, no langoroso movimento felino de sagacidade e de rapidez? Por que não procurar entre as serpentes, desde a imensa e retardatária sucurijú à rápida e traiçoeira cascavel, a voluta graciosa para os consolos ou capitéis de colunas cujos fustes poderão ser interpretados das touceiras de açai e de tantas outras palmeiras flexuosas?
Por que repetir, dentro das nossas ornamentações, o louro e o carvalho, o marronier e o pinheiro, quando nós, Brasileiros, possuímos a mais bela coleção de palmeiras, a mais luxuriante flora, da mata, do sertão e da praia, as mais curiosas e extravagantes lianas e cipós esguios e direitos, tortuosos e enovelados, a mais inebriante escala cromática nas pétalas das orquídeas e flores campestres, a mais delicada quantidade de avencas, desde a erétil samambaia dentro da sombra úmida dos vales ressequida e recortada avenca rasteira dos campos cobertos, semelhante a longos lençóis de renda caprichosa, na forma e na coloração variada?
Por que não buscar, na curiosa e pouco conhecida ainda cerâmica dos indígenas de Marajó, motivos delicados da ornamentação geométrica decoração sóbria mas típica, afim de decorarmos fundos, frisas e rosáceas dos nossos muros, painéis, tapetes, mosaicos, etc., etc.? Para que, pois, escravizarmo-nos às gregas copiadas e recopiadas que o estrangeiro exportador nos impinge a preço de prejudicar duplamente a nossa arte nacional?
Já é tempo de refletir sobre essa nociva importação de mau gosto adubada por uma literatura duvidosa.
Nada nos obriga a essa subserviência intelectual quando possuímos como nenhum outro povo, a matéria-prima incomparável e a inteligência dúctil e omnimoda dos nossos habilíssimos operários…” (Braga, Theodoro. “Estylisação Nacional de arte decorativa applicada”. Fac-simile publicado na revista eletrônica 19&20.)

*Estatuto Original é o termo utilizado por Eidorfe Moreira à página 100 da publicação de 1977.
A Ementa do Decreto é: “Aprova o Estatuto da Universidade do Pará”.

NOTA DO EDITOR: O conjunto das fotografias tiradas no dia 31 de janeiro de 1959, um sábado, algumas aqui identificadas a partir da lógica do texto de Eidorfe Moreira, pertencem à Universidade Federal do Pará.
Podem ser encontradas na Biblioteca Central e no Museu da UFPA.
Apesar de ser a mais rica documentação do ato de instalação da Universidade do Pará, não há registros de sua autoria, nem da identificação exata dos personagens que ocupavam a mesa oficial.

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Curiosidade encontrada no livro:


Sobre o autor de PARA A HISTÓRIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (PANORAMA DO PRIMEIRO DECÊNIO):


Veja a rota desta pesquisa em publicações no Blog da FAU.

[HB]

Sobre o Projeto Laboratório Virtual - FAU ITEC UFPA

Ações integradas de ensino, pesquisa e extensão da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Instituto de Tecnologia da Universidade Federal do Pará - em atividade desde maio de 2010. Prêmio Prática Inovadora em Gestão Universitária da UFPA em 2012. Corpo editorial responsável pelas publicações: Aristoteles Guilliod, Fernando Marques, Haroldo Baleixe, Igor Pacheco, Jô Bassalo e Márcio Barata. Coordenação do projeto e redação: Haroldo Baleixe.
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3 respostas para O Brasão Original no “Estatuto Original” da U(F)PA

  1. Juliano disse:

    Eidorfe era mesmo genial, e esta história da história da UFPA também é muito interessante.
    A idéia de um sentido da iconografia da instituição é intrigante.
    Parabéns!

  2. Ivan Brasil disse:

    Fui Editor do livro Geografias Mágicas de autoria do prof. Eidorfe Moreira e convivi, como é de praxe, com o autor, durante a edição da publicação.
    Um notável memorialista da História do Pará e dos primórdios da história da então Universidade do Pará.
    Foi professor de Geografia no antigo Colégio Moderno.
    Penso que vale o registro.
    Ivan Brasil

    .

  3. Octavio Mello de Almeida Filho disse:

    Fui aluno do Prof. Eidorfe no Colégio Moderno há mais de sessenta anos atrás e, até hoje, o relembro com a admiração e o afeto respeitoso do aluno pelo mestre. Ainda que nascido na Paraiba, um grande paraense, um grande brasileiro. Um grande exemplo.
    Octavio Mello de Almeida

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