Existem certas ideias errôneas sobre a função do arquiteto que ficariam esclarecidas ante um exame crítico do papel que cabe a este profissional.
Não importa o tipo ou tamanho do edifício a ser projetado e construído, o arquiteto primeiro procura juntar os dados que lhe dizem respeito, para em seguida selecioná-los e distribuí-los da forma mais lógica e com eles organizar um programa de ação. Entre esses dados ocupam maior destaque as quantias em dinheiro disponíveis ou necessárias, o local e natureza do terreno, sua relação com as vias de acesso, sua orientação e, não menos importante, as necessidades das pessoas que ocuparão o edifício e a finalidade a que se destina – residência, escola ou hospital.
Em seguida o arquiteto analisa os dados conseguidos, para deles, aos poucos, e com muito estudo, fazer uma síntese. A solução, portanto, é o resultado de uma análise e uma síntese e é procurada de dentro para fora. Em outras palavras, as fachadas surgem assim como expressão dos interiores e nunca ao contrário. Os elementos componentes da estrutura são distribuídos integralmente, internamente e externamente. Uma arquitetura de espaço e volumes. O arquiteto em ação assemelha-se ao compositor, que, tendo escrito uma sinfonia, se transforma no condutor da orquestra. Ele deve conhecer, enquanto desenha, todos os materiais a serem empregados e dominá-los por completo. O desenho para ele é um meio de comunicação e não o fim de sua técnica e nisto ele difere do desenhista.
O arquiteto vê o projeto nascer, deu-lhe vida e acompanha seus primeiros passos com a ansiedade de um pai. Ele vê o edifício antes de ser construído, e prevê como ele se portará com o sol, a chuva e os ventos. Imagina-o abrigando seres humanos, e, as vezes, animais também. E assim, dá-lhe forma e dimensão no papel, para em seguida lhe dar forma e volume no espaço e no tempo, exatamente como faria o compositor, ouvindo e fixando sons por meio de notas.
Infelizmente, o arquiteto não é como o pintor, o escritor ou o escultor. O pintor toma seu pincel, o escritor de sua pena e o escultor de seu barro, e , cada um, sozinho, começa a executar uma ideia. Com o arquiteto não é assim. Ele não pode começar nada, a menos que alguém tenha necessidade de seu trabalho e de sua técnica. Nisto ele se distingue do artista puro, pois apesar de ser ele também um artista, o arquiteto, é, acima de tudo, um especialista. Ele não pode sentar-se à sua prancheta e desenhar uma hipotética fábrica, uma residência, ou um prédio de apartamentos, a menos que não desconheça certas condições. A primeira é que alguém lhe tenha falado “Quero um projeto para construção de um clube social”, a segunda, que este alguém lhe tenha fornecido as necessidades deste clube, dados financeiros e espaço. O cliente não está pedindo apenas um desenho, mas se está valendo dos serviços profissionais de um técnico, um planejador por excelência. O cliente quando vai ao dentista não pede que seu dente seja obturado por este ou aquele método, ele quer que o resultado seja bom e dentro de suas possibilidades financeiras. Ele pode, é claro, achar que uma obturação de ouro fica mais bonito que uma de porcelana, isto em dentes incisivos centrais. E então em arquitetura todos entendem de beleza… Mas, em suma, a não ser que alguém concorde em aceitar a ajuda de um arquiteto e lhe dê as realidades de um problema positivo, ele não pode começar. É evidente que o arquiteto pode desenhar pelo simples prazer de desenhar, mas, não esqueçamos que ele também é humano, come, bebe, dorme e vive como os outros.
O arquiteto de hoje não somente é um criador, mas é também um coordenador. Para grandes projetos cerca-se de engenheiros de estruturas, de fundações, mecânicos, técnicos em acústica, em iluminaçãoe e paisagistas. Seu cérebro trabalha sempre fazendo uma combinação lógica, econômica e bela, dos elementos que se transformarão nas partes do edifício. O arquiteto dirige seu sonho desde o princípio até a completa e tangível realização. Não é como o engenheiro civil que pratica “arquitetura” que tem pesadelos comunicados pelo cliente, e que, transmitidas ao desenhista, mal chegam a ser interpretadas antes de serem realizadas. O arquiteto não se esquece de que os erros do médico se enterram, mas os seus ficam à mostra.
Fonte: A Província do Pará de 05 de abril de 1953, página 04.
Colaboração: Aristóteles Guilliod de Miranda.
Pelas comparações fotográficas, fundamentadas nos meus arquivos, afirmo que a foto publicada é do prof. Paul Albuquerque que por sinal tive o prazer de começar a conhecê-lo no ano de 1968 quando ao passar em primeiro lugar no vestibular de Arquitetura fui recebido pelo mesmo com um cordial abraço. Sempre o admirei pelas suas saudáveis polêmicas e disciplina no trato das coisas públicas.
Ronaldo Marques de Carvalho.
Gostei do texto do Mestre Paul. Escrito há mais de 60 anos, penso que a única ideia datada é a manifestação da postura funcionalista de projetar.
É ele sim.
Só respodi hj porque estive fora de Bel.
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