A fotografia acima, sem datação, nos é inédita; foi ela enviada pelo colaborador Igor Pacheco, editor do Fragmentos de Belém, e mostra a sequência dos prédios postos à venda em 1940: Cinema Popular, Bar Pilsen, Fábrica de Cerveja Paraense e Bar Theatro Paraense; todavia, o que se vê na marcação do Cinema Popular é o Botequim Casa Machado: Tabacaria, Botequim e Bilhares.
A Fábrica de Cerveja Paraense – que não possui relação alguma com a CERPASA, Cervejaria Paraense S. A. fundada em 1966 – ocupou o cenário da principal via de expansão e integração de Belém: a Avenida da Independência, antes Estrada do Utinga, do Maranhão; bem como viu seu endereço mudar nominalmente para Avenida Cypriano José dos Santos na década de 1920 e retornar à Independência nos anos 1930, com nova numeração que trocou o seu 12 por 78.
Ainda não descobrimos os extremos do intervalo em que a Avenida Independência foi chamada Cypriano Santos; possivelmente após a morte do próprio, médico e político, em 1923 – sabe-se, pelo Almanak Laemmert, que em 1935 já estava desfeita a homenagem e a F. C. P. era achada na Avenida da Independência nº78.
Ernesto Cruz, à página 94 de Ruas de Belém, equivoca-se, em cinco anos, com o falecimento de Cypriano – O Bar Pilsen, vizinho à F. C. P., quando explorado por Affonso Lopes & Cia. em 1925, já ocupava o número 14 da Cypriano Santos, indivíduo extinto na condição de vice-governador do Pará por ser o presidente do Senado do Estado.
Fontes: jornais 1923-1935.
A imagem publicada no Relatório 1906 do intendente Antonio José de Lemos mostra o núcleo fabril pioneiro no primeiro ano de funcionamento da Fábrica de Cerveja Paraense; observe-se a cerca de madeira, recém construída, no sentido longitudinal do terreno, com perspectiva à Estrada da Constituição (hoje Avenida Gentil Bitencourt); a iconografia sugere o limite lateral primitivo do terreno comprado de Dona Maria da Ponte e Souza em 1899, seis anos antes.
Se comparados dois recortes, um publicado em Os 21 anos da Fábrica de Cerveja Paraense e o outro em O Complexo Fábrica de Cerveja Paraense, notaremos a diferença de 10.240m² entre os anos de 1926 (29.760m²) e 1947 (40.000m²) quando a Fábrica de Cerveja Paraense foi vendida, pelo Governo do Estado do Pará, à Companhia Cervejaria Brahma:
O acréscimo significativo na superfície do terreno, salvo falhas da impressão tipográfica dos jornais, abre dúvida para quando a Casa Machado e o Bar Pilsen passaram a integrar o patrimônio da F. C. P. que em 1926 teve melhoramentos divulgados em periódico carioca como inauguração (aos 21 anos de funcionamento) feita pela diretoria composta por Antonio de Almeida Facióla, Eduardo Tavares Cardoso e Menasses Belsimon.
Os investimentos dessa nova administração da usina propiciaram uma sobrevida de 13 anos; quando, em 1939 há a sua liquidação e inúmeros funcionários e operários, muitos dos quais com 15 e 30 anos de serviço, perdem seus empregos.
O Paiz de 12SET1926, mesmo na evidência da propaganda, deu sinais do risco: a F. C. P. tinha capacidade produtiva para 5 milhões de litros anuais de cerveja, porém, pela retração do mercado, só fabricava a metade, diversificando o potencial do novo maquinário com refrigerantes e outras bebidas não alcoólicas.
O Correio da Manhã (RJ) de 22JUL1930 diz que as rendas gerais da F. C. P. caíram 470:919$740 em relação ao primeiro semestre de 1927 quando o decréscimo iniciou constância.
A situação agravou-se paulatinamente e em 1933 surge uma greve que, dentre outras reivindicações trabalhistas, exige o restabelecimento de chopp aos reclamantes – some-se a isto, no mesmo momento, uma multa elevada (130:000$000) de imposto federal por sonegação aplicada à usina.
A Manhã (RJ) de 20AGO1935 dá panorama à política paraense destacando à imprevisibilidade do velho trapezista Antonio Facióla como um dentre os dois protagonistas da vitória na eleição indireta e fisiológica do advogado José Carneiro da Gama Malcher ao Governo do Pará – Facióla faleceria em 1936 como deputado estadual, mas fora senador do Estado e, concomitantemente, intendente municipal.
Morto Facióla a Fábrica de Cerveja Paraense ficaria mais três anos em funcionamento, até 1939; certamente a desenvoltura e prestigio do abastado comendador em governos distintos – Eurico Valle, Magalhães Barata e José Malcher – converteram-se em subsidio tácito à Sociedade Anônima que durou quarenta anos.
Em 27 de julho de 1940 a F. C. P. é posta em malogrado leilão; somente em 1943 é desapropriada, a bem da utilidade pública, pelo interventor Magalhães Barata que por ela pagou quatrocentos mil Cruzeiros; Barata intencionava instalar na antiga fábrica um magnífico modelo que resolveria o problema de abastecimento de carne verde à população – a F. C. P. era dotada de espaçosas câmaras frigoríficas que alugava a importadores de gêneros perecíveis ou a qualquer que pudesse pagar por elas.
Em 1947, por decreto-lei, o major Moura Carvalho, então governador do Estado do Pará, vende a F. C. P. à Companhia Cervejaria Brahma do Rio de Janeiro, com a condição de que no local fosse instalada uma moderna fábrica de cerveja.
A Brahma fez da F. C. P. depósito e manteve em funcionamento, dentro do complexo que adquiriu, o Bar Pilsen (nota de revitalização do lugar em 1947) e o Cinema Popular (notícia policial de 1951).
Por ora desconhecemos as ocorrências com a Fábrica de Cerveja Paraense entre 1951 e 1962, quando os paraenses Alcyr Boris de Souza Meira e Geneciano Fernandes Luz adquiriram, intermediados pelo escritório Freitas Valle do Rio de Janeiro, toda a área dita de 40.000m² da Brahma e lá planejaram o Loteamento Jardim Independência, objeto de matéria futura.
Fonte: jornais 1925-1951.
Postscriptvm (16/12/2016): o recorte abaixo mostra o Cinema Popular em funcionamento em 1929, ano em que Antonio de Almeida Facióla fora nomeado intendente municipal pelo governador Eurico de Freitas Valle:
A mudança do nome da Avenida da Independência para Cypriano Santos, a qual estimamos uma duração de 10 anos entre 1925 e 1935, provoca confusões nas investigações.
Postscriptvm (17MAR1917):
Nota enviada pelo colaborador Aristóteles Guilliod de Miranda mostra que a avenida da Independência passou a ser chamada de Cypriano Santos em 1924.
Sobre as mudanças dos nomes de rua nas décadas de 20 e 30.
Com a revolução de 30 a turma nova tentou por força apagar o nome da geração da República Velha.
Por sinal a turma da república velha dava o nome dos caras ainda em vida para as coisas.
A revolução de 30 saiu mudando tudo.
Exemplos: Colégio Paes de Carvalho virou Ginásio Paraense.
Instituto Lauro Sodré virou Instituto Dom Macêdo Costa.
Largo de Santa Luzia, que tinha mudado para Praça Camilo Salgado, voltou a ser Largo de Santa Luzia.
Grupo escolar Wenceslau Braz, virou Dr. Freitas.
Museu Emílio Goeldi virou Museu Paraense.
Rua Ferreira Pena (original) virou Assis de Vasconcelos.
No final dos anos 30 e início dos 40, com os ânimos mais frios, e quem sabe alguma dose de bom senso , alguns lugares voltaram a ter seus nomes primitivos, destaco o Paes de Carvalho, o Lauro Sodré e a Praça Camilo Salgado. O Museu Goeldi, virou Museu Paraense Emílio Goeldi (Uma fusão de nomes).
Outras homenagens trocadas, jamais foram destrocadas.
Acho que foi o que aconteceu com o Cipriano e outros. Faltou um padrinho forte talvez que lutasse pelo retorno do nome. Ao menos ele ganhou outra rua.
Ao que tudo indica, José Maria, este caso é distinto: detectou-se o nome do Cypriano Santos ainda em 1925, tendo ele falecido em 1923.
O primeiro retorno ao nome Avenida Independência percebeu-se em 1935 coincidentemente (ou não) ao início do período governamental de José Malcher.
No caso o Cypriano Santos não ganhou outra avenida; acredita-se (foi o professor Fabiano Homobono quem levantou a hipótese) que houve obediência ao traçado do Mapa de José Sidrim (1905) que projeta a Avenida Independência a uma via não nomeada que corresponderia hoje à Avenida Perimetral da Ciência.
Quando a Avenida Independência deixou de ser Cyprianos Santos, o fez até São Brás; no prosseguimento permaneceu assim.
É um raciocínio razoável, mas passível de contestação por documentos.
Tenho um copo da cerveja dessa fábrica de 1905 herdado de familia
Mónica: você poderia fotografá-lo e enviar para haroldobaleixe@gmail.com? Assim poderíamos publicá-lo.