Seria o quiosque Café Iracema mais uma obra de Bolonha?

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A imagem acima é um recorte da fotografia pertencente à Biliblioteca da Universidade Purdue; datada da década 1930, mas anterior à Praça do Relógio (inaugurada em 05 de outubro de 1931), ela revela a inexistência de qualquer edificação na área entre o Mercado do Ver-o-peso e a Recebedoria de Rendas do Estado do Pará (hoje Solar da Beira) — salvo um pequeno kiosque, em madeira e ferro, próximo à margem da Baía do Guajará.
Entretanto: na Mensagem apresentada ao Congresso Legislativo do Estado do Pará pelo governador Eurico de Freitas Valle no dia 07 de setembro de 1930, no tópico administração pública — municipal,  lê-se:
“Pretende a Municipalidade construir entre o Mercado de Ferro e a Recebedoria um elegante mercado para a venda de flores e plantas ornamentais.”.
O intendente, indicado por Eurico Valle, era Antonio Facióla, que teve, junto com o governador, o mandato interrompido com a Revolução de 1930, saindo do poder municipal em 24 de outubro daquele ano.
Ao contrário do exílio imposto a Valle e o sequestro de seus bens pelo governo revolucionário que teria posto fim à Velha República, Facióla, em novembro de 1931 seria nomeado, pelo major Magalhães Barata, membro do Conselho Consultivo do Estado, como noticiou o jornal O Imparcial (do Maranhão):

O Imparcial (Maranhão) - 05-nov-1931A questão desta postagem é o surgimento desse equipamento urbano, se seria ele contemporâneo aos dois quiosques que tratamos em Os kiosques de cimento armado no Ver-o-peso seriam de Francisco Bolonha?.
Por ora a única imagem que mostra o sítio tem datação provável dos anos 1970, o que não nos permite uma comparação retroativa, somente com o que estaria por vir:

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A fotografia não revela uma floricultura como pretendia Facióla, mas um quiosque, o Café Iracema* que fora restaurado (ou reconstruído) por ocasião da reforma empreendida no complexo do Ver-o-peso por Almir Gabriel quando prefeito de Belém, entre 1983 e 1985, indicado pelo governador Jader Barbalho.

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O quiosque hoje, como fruto das obras de Almir Gabriel já deterioradas, ainda exibe as modificações pelas quais passou, transformando-se num modelo replicado na Feira do Açaí, local onde jamais houvera um:

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Recorte de postal também da década de 1970: Feira do Açaí

O professor Jaime Bibas, editor vitalício do Blog da FAU, compôs a equipe técnica da Prefeitura Municipal de Belém, capitaneada por Paulo Chaves Fernandes, responsável pelas intervenções naquela paisagem urbana.
Bibas recorda que as coberturas desses dois quiosque mais a do banheiro erigido na Feira do Açaí, ao lado do antigo Necrotério, foram pensadas pelo engenheiro Arquimino Ataíde e são, na realidade, em fiber glass pintadas de cinza para falsear a aparência do concreto.

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O fake quiosque  na Feira do Açaí e o banheiro que obedece a mesma tipologia, ambos inspirados no Café Iracema

Outro fato curioso lembrado por Jaime Bibas é o quiosque instalado no Curro Velho, esse de outra feição, calcado em uma fotografia do jornal A Província do Pará, cedida à época por Roberto Jares.
O projeto, de autoria da arquiteta Rosário Lima da Silva, serviria à reforma da Praça Brasil — onde o quiosque fora demolido — a ser executada na administração do primeiro prefeito eleito pós golpe de 1964, Fernando Coutinho Jorge (1986-88); contudo, por algum motivo que JB esqueceu, não foi possível materializá-lo no local original.
Com a revitalização do abandonado Curro Velho, no governo de Hélio Gueiros (1987 a 1991), Bibas sugeriu à professora Dina Oliveira, idealizadora da transformação daquele espaço público, que tal objeto fosse lá edificado, o que ocorreu, com cobertura em ardósia, nomeado Recreio Jornalista Mario Couto:

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Quiosque do Curro Velho e a placa nele afixada em 1991

A mesma questão se aplica ao quiosque original da Praça Brasil: seria ele mais uma das construções modernas, em cimento armado, de Francisco Bolonha?

*Ainda não sabemos se o Café Iracema fora o primeiro e único inquilino do quiosque, nem se tal equipamento sofreu mutações entre o seu surgimento e a fotografia da década de 1970.

A fotografia da década de 1970 é do acervo de
Igor Pacheco, editor do site Fragmentos de Belém.


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Uma outra fotografia, sem datação, há pouco encontrada na página Nostalgia Belém do Facebook, traz à tona outra edificação anterior ao Café Iracema na mesma área onde Facióla idealizara seu mercado de flores e plantas ornamentais.
Coincidência ou não o quiosque hoje está à frente das barracas de ervas e raízes na Feira do Ver-o-peso.

Sobre o Projeto Laboratório Virtual - FAU ITEC UFPA

Ações integradas de ensino, pesquisa e extensão da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Instituto de Tecnologia da Universidade Federal do Pará - em atividade desde maio de 2010. Prêmio Prática Inovadora em Gestão Universitária da UFPA em 2012. Corpo editorial responsável pelas publicações: Aristoteles Guilliod, Fernando Marques, Haroldo Baleixe, Igor Pacheco, Jô Bassalo e Márcio Barata. Coordenação do projeto e redação: Haroldo Baleixe.
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2 respostas para Seria o quiosque Café Iracema mais uma obra de Bolonha?

  1. Raymundo Corrêa de Almeida Neto disse:

    “O projeto, de autoria da arquiteta Rosário Lima da Silva, serviria à reforma da Praça Brasil — onde o quiosque fora demolido — a ser executada na administração do primeiro prefeito eleito pós golpe de 1964, Fernando Coutinho Jorge (1986-88); contudo, por algum motivo que JB esqueceu, não foi possível materializá-lo no local original”.

    O quiosque outrora existente na Praça Brasil, atual Praça Santos Dumont tinha como localização à equina da Avenida Senador Lemos com à Rua D. Pedro I, onde hoje encontra-se um ponto de taxistas. Ficava confronte a uma agência do antigo Banco Nacional S/A e onde hoje está sendo erguido um novo edifício do TRT da Oitava Região.

    Espero ter colaborado!!

  2. Omayr José de Moraes Junior disse:

    Prezado (a),
    Bom dia!
    Pergunto se há como saber quem eram os proprietários ou arrendatários dos quiosques de Belém no início do século XX. A curiosidade advém de haver uma informação de que meu bisavô mantinha esse tipo de comércio. Meu avô, José Manuel de Moraes, migrou para o Rio de Janeiro na década de 1930. Dele é que procede a informação acerca dos quiosques. Perdemos o contato com o restante da família.
    Perdoe a impertinência.
    Muito obrigado

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